ii.09. A Origem das Notas Musicais

O primeiro experimento científico da matemática foi em uma arte, a música. Pitágoras esticou uma corda e viu que ela produzia som. dividiu esta mesma corda em duas e verificou outro som. A quarta parte e a terceira parte desta corda também produzia sons. Cada uma destas partes correspondia a uma nota musical. Manejando as frações matemáticas, Pitágoras fez música.
Foi em um instrumento de somente uma corda, chamado de Monocórdio, foi que Pitágoras realizou suas experiencias no século VI a.C, mais especificamente em 582 a.C., e que deu à luz uma de suas mais belas descobertas, o quarto ramo da matemática, a música. Este experimente tenha sido a primeira tentativa de organizar o espectro sonoro no ocidente, na Grécia Antiga.
A palavra Monocórdio deriva do grego monochórdon (pelo latim monochordon) e significa literalmente “um fio”. Um esquema simples de monocórdio consiste apenas em uma corda sonora, presa em suas duas extremidades, e um dispositivo móvel, que permite que se faça vibrar apenas uma fração da corda, como ilustrado abaixo:

Afim de simplificar, vamos representar o Monocórdio basicamente com a seguinte ilustração:


Pitágoras percebeu então que o som produzido por esta corda esticada:

E pela sua metade:

Eram reconhecidos pelos nossos ouvidos como sendo o mesmo som, com a diferença de o som produzido pela corda inteira era mais grave e o produzido pela metade da corda era mais agudo.
Todavia, a fazer vibrar a terça parte da corda original, Pitágoras percebeu que um novo som havia surgido:

Quando tocados simultaneamente, na corda inteira e a na sua terça parte, estes sons produziam uma agradável combinação ao ouvido humano:

Dividindo sucessivamente esta corda na sua quarta parte, quinta, sexta e assim por diante, Pitágoras foi organizando matematicamente o espectro sonoro e encotrando as relações matemáticas entre cada som através das frações.
Da mesma maneira que o som produzido por uma corda e o som produzido por esta corda reduzida à sua terça parte produzem uma combinação agradável aos nosso ouvidos:

O som pruduzido pela terça parte da terça parte também produzira uma combinação agradável ao ouvido humano:

Observe que matematicamente temos os seguintes valores para cada uma das três cordas anteriores:
E foi provavelmente assim que há muitos séculos, na China, um indivíduo criou uma escala de sons musicais a partir da sucessiva divisão de um som original. Ele tomou uma corda, e ao vibrar a sua terça parte obteve o som:
Ao dividir novamente e fazer vibrar a terça parte da terça parte, ele obteve o seguinte som:
E assim ele dividiu sucessivamente na terça parte até encontrar o sexto som:
Mas pela primeira vez nesta experiência um som não combinava com o som original:
Eles, pelo contrário, eles se pareciam excessivamente, de forma que foi ignorado, e foi criado uma escala com os 5 primeiros sons da experiência, que eram diferentes mas que combinavam entre si, dando origem à escala de sons conhecido hoje como escala pentatônica:
Na escala pentatônica, todos os sons combinam entre si. Como experiência, toque somente as teclas pretas de um piano.
A escala pentatônica é a escala da música oriental. Todas os sons desta escala têm uma relação matemática idêntica entre si, que é sempre a terça parte do som respectivamente anterior.
Sobre a origem propriamente da escala pentatônica, as opiniões são contraditórias. Algumas afirmações indicam que, como exposto acima, “foram os chineses os primeiros a examinar a relação entre quintas, e assim estabelecer a escala Pentatônica (de cinco tons), sendo que os documentos que comprovam esta descoberta datam de 3000 a.C. (Yehudi Menuhin e Davis, 1990:29).
Porém, contrariando esta primeira afirmação, Montanari afirma que uma das civilizações mais antigas foi a dos sumérios, que ocupavam a Região sul da mesopotâmia, na Ásia central, a cerca de 6000 anos. Sabe-se que possuíam um método de leitura musical baseado em letras, e que se utilizavam de instrumentos para acompanhar vozes em oitavas. Os costumes musicais dos sumérios foram herdados pelos caldeus e assírios (outros povos que habitavam a Mesopotâmia), e mais, podemos afirmar que a principal característica musical desses povos da Mesopotâmia — em particular dos assírios — era a escala pentatônica. (Montanari, 1988:08-09).
Voltando ao experimento com o monocordio, e regulando sua corda para vibrar a 256 Hz (f0), equivalente à nota DÓ, ao vibrarmos a sua metade ela passa a vibrar uma oitava acima, isto é, em 512 Hz (f1), mas mesmo assim ainda é uma nota DÓ.

Quando duas cordas vibram em uma mesma nota (DÓ1, p.ex.), diz-se que estão em uníssono. O uníssono é representado pela razão 1:1. O intervalo de DÓ a DÓ é chamado de intervalo de oitava. Desta forma sempre que duas notas tiverem suas freqüências relacionadas por o intervalo entre elas será de uma oitava. Isto é, para obtermos um intervalo musical de uma oitava devemos dobrar a freqüência da nota produzida.

A oitava (diapason em grego) é o som que vibra no dobro da freqüência; está representada pela razão 1:2.

Perceba, então, que todas as notas que usamos na música ocidental encontram-se dentro de um intervalo de uma oitava, pois a partir daí as notas irão começar a se repetir em freqüências mais altas.

Pela sua divisão sucessiva, faz-se a corda vibrar em relações fracionárias referentes ao seu comprimento original: a 8/9, a 4/5, a 3/4, a 2/3, a 3/5, a 8/15 de seu comprimento total, como ilustrado:

As vibrações sonoras de cada fração são diferentes entre si, mas todas têm um ponto em comum com a fundamental (original): têm com ela uma relação matemática, e formam com ela uma sucessão sonora. Duas frações são os mais importantes: a correspondente a 2/3 do comprimento total (a denominada quinta – diapente); e a correspondente a 3/4 do comprimento total (a denominada quarta – diatessaron). Estas razões podem ser obtidas a partir de quatro números inteiros, os quais correspondem, respectivamente, a uma corda de comprimento igual a 12 partes (o uníssono); à sua metade 6 (a oitava); a 8 partes (a quinta); a 9 partes (a quarta).

O produto de 2/3 por 3/4 dá a fração 1/2, associada à oitava. A divisão (2/3):(3/4) é igual a 8/9, que representa um tom (é a diferença entre uma quinta e uma quarta, que é representada por uma divisão). A oitava, então, é composta por duas quartas e um tom: 3/4 x 3/4 x 8/9 = 1/2 (A razão 1:2, como se viu, representa a oitava).

As vibrações de cada uma das frações da corda representam a gama denominada gama natural, e cada vibração (correspondente a uma nota musical) recebe um nome:


Em relação aos comprimentos das cordas, tem-se:


Há, então, uma relação entre as freqüências da corda em vibração e o seu comprimento. Como se viu, para 2/3 do comprimento da corda, obtém-se 3/2, ou 1,5 vezes a freqüência original, equivalente à quinta ou dominante (SOL em relação a DÓ).
As relações matemáticas derivadas das vibrações relativas aos diversos comprimentos da corda indicam o seguinte: quando um som dá uma vibração, a sua oitava dá duas vibrações; quando dá duas vibrações, a sua quinta dá três vibrações; quando dá três vibrações, a sua quarta dá quatro vibrações, e a sexta, cinco vibrações, e assim por diante.
Neste ponto vamos falar sobre a idéia de intervalo musical. O intervalo é uma espécie de medida de distância entre duas notas musicais. Se começarmos no DÓ e quisermos medir sua distância até o SOL, dizemos que o intervalo é de quinta, pois contando a partir do DÓ para chegarmos ao sol teremos: DÓ (1), RÉ (2), MI (3), FÁ (4), SOL (5). Assim, dizemos que o intervalo de DÓ a SOL é de uma quinta.
Duas notas, quando tocadas simultaneamente (ao mesmo tempo) podem soar aos nossos ouvidos de forma a combinarem entre si, ou de forma tensa e áspera. Os intervalos que sentimos como estando em combinação, ou simpatia, são chamados de Consoantes e os ásperos ou tensos, são chamados de Dissonantes. Embora varie de ouvinte para ouvinte a nível sensitivo, essa sensação depende exclusivamente da razão entre as freqüências dos sons.

Os intervalos consonantes são expressos por frações em que o numerador e o denominador são termos menores que 6: 
  • O uníssono (dó-dó): 1/1;
  • Intervalo de quarta (dó-fá): 4/3;
  • Intervalo de quinta (dó-sol): 3/2;
  • O intervalo de quarta (dó-fá): 4/3) assim chamada por ser a quarta nota após a nota DÓ1;
  • O intervalo de quinta perfeita ou justa (dó-sol): 3/2;
  • O intervalor de oitava (dó-dó): 2/1.
Os intervalor consonantes imperfeitas são:
  • O intervalo de terça maior (5/4) ou terça menor (6/5),
  • O intervalo de sexta maior (5/3) ou sexta menor (8/5). 
Os intervalos dissonantes são expressos por frações cujos termos aparecem inteiros maiores que o número 6:
  • Intervalo de segunda (dó-ré): 9/8;
  • Intervalo de sétima (dó-si): 15/8;
  • Todos os intervalos aumentados ou diminuídos (sustenidos e bemóis).
Escalas e gamas musicais

Existem infinidades de sons intermediários entre os sons mais graves e os sons mais agudos, porém, só se tomam os que formam com o som fundamental intervalos definidos, representados por números inteiros. Nestes intervalos definidos, dos quais só se vai de um para outro por saltos ou degraus, estão as denominadas notas musicais.

Denomina-se escala musical à série ascendente ou descendente de oito notas sucessivas, a partir da nota fundamental, sendo a última semelhante à primeira, mas situada uma oitava acima ou abaixo. Este é o sistema mais conhecido (que é a escala de oito notas). Existem outros tipos de escalas. A escala, de qualquer modo, sempre tem uma nota a mais que a gama: E = G + 1.

As notas sucessivas da escala formam, com a nota fundamental, intervalos de segunda, terça (ou terceira), quarta, quinta, sexta, sétima e oitava. É importante frisar que o que define uma escala, seja ascendente ou descendente, é a sua primeira nota, denominada tônica ou fundamental. Deve haver uma perfeita continuidade harmônica entre as notas, quando tocadas sucessivamente, ou seja, o ouvido não deve perceber nenhuma irregularidade.

Denomina-se gama musical à sucessão de sete notas. Existem várias gamas musicais: a gama natural; a gama de Zarlin ou de Ptolomeu; a gama de Pitágoras; a gama diatônica; a gama cromática; a gama temperada; etc. A gama musical forma uma série de notas cuja nomenclatura se desenvolveu de forma diferente, pois foi influenciada por culturas diferentes. Basicamente temos hoje em uso as seguintes nomenclaturas:




Este sistema silábico deve-se ao monge beneditino italiano Guido D’Arezzo (995-1050), o qual percebeu uma relação entre as notas musicais e as sílabas dos versos do hino ao padroeiro dos músicos, São João Batista:

UT queant laxit
REsonare fibris
MIra gestorum FAmuli tuorum
SOLve polluti
LAbis reatum
Sancte Ioannes

A nota SI é a reunião do último verso, Sancte Ioannes. Quanto à nota UT, foi mais tarde trocada para , para melhor entoação, e vem de DOmino (Senhor).
 
As diversas gamas sucessivas recebem, convencionalmente, índices que designam as gamas inferiores (DÓ-1 DÓ-2 DÓ-3 ; etc.) e as gamas superiores (DÓ2 DÓ3 DÓ4 etc.), sendo a gama central a de índice 1: DÓ1 RÉ1 MI1 FÁ1 etc., sendo DÓ1 dada pelo DÓ grave do violoncelo.
 
O piano geralmente tem um alcance de sete oitavas, desde LA-2 (27 Hz) até LÁ6 (3.480 Hz), sendo que a série completa dos sons musicais se estende por oito oitavas:
 

Ao contrário dos músicos, os físicos indexam estas nove oitavas de -1 até 9 (-1 1 2 3 4 5 6 7 8 9). 
 
O DÓ mais grave, DÓ-2 (16 Hz) é emitido pelo grosso bordão do órgão.
 
O LÁ3 é adotado como padrão de freqüência para afinação. Entretanto, sempre houve confusão entre físicos e músicos, no que se refere à freqüência de notas musicais. Os primeiros preferem números inteiros, em potências exatas de 2; os músicos preferem guiar-se pelo ouvido. Deste modo, para os primeiros, DÓ3 (tecla central do piano) vale 256 Hz, enquanto que os últimos preferem 261 Hz.
 
A confusão é maior quando se trata de conhecer freqüências de outras notas, pois alguns se guiam pelos intervalos temperados. Além disso, até meados do século XIX, não existia uma padronização mundial quanto às freqüências das notas. No século XVIII, o tom de afinação LÁ3 podia valer 415 Hz, 422,5 Hz ou até 428 Hz.
 
Historicamente, as orquestras tendem a agudizar (tornar mais agudo) o tom de afinação. O padrão de afinação, LÁ3, ao final deste século tinha 455 Hz na Inglaterra e 461 Hz nos EUA. Em 1859, uma Comissão Internacional escolheu o valor de 435 Hz como padrão de afinação. Tal valor foi modificado para 440 Hz em 1939 em uma Conferência Internacional, valor este confirmado pela Organização Mundial de Padrões (Standards) em 1953. Entretanto, mesmo nos EUA, esta padronização não vingou, pois algumas orquestras ainda usam o tom em LÁ3 com 442 Hz e até 444 Hz.
 
É fácil calcular a freqüência de qualquer outra nota que se queira, pelo intervalo natural. Basta multiplicar a fundamental pela relação de intervalo. Por exemplo, considerando a fundamental a nota DO3 a 261 Hz, temos:

Chama-se temperamento à correta diferença de altura entre os 13 sons de uma oitava que originam as músicas, e constituem o que chamamos de escala musical, definida pelas notas , , mi, , sol, , si, e , acrescidas das suas respectivas variações, quando houver, o bemol (b) ou o sustenido (#), símbolos estes que significam respectivamente a diminuição e o aumento de tonalidade (freqüência) em 1 semitom. Se considerarmos as variações aumentadas, temos o #, #, #, sol# e #. Considerando as variações diminuídas temos b, b, solb, b e sib.

O temperamento de intervalos iguais esteve no esquecimento até Bach escrever os 24 prelúdios de “O Cravo Bem Temperado”, em 1722 . Essa obra foi a primeira a exigir de fato uma afinação desse tipo porque percorria todas as tonalidades em modo Maior e Menor. O sistema que prevalecia anteriormente era o temperamento de meios tons, que dava uma maior aproximação da afinação natural que o temperamento de intervalos iguais, para o tom de Dó Maior (por exemplo) e os outros tons relacionados de perto com ele, mas afastava-se de tal maneira dos tons afastados de Dó que se tornava praticamente impossível tocá-los visto que a sonoridade se tornava desagradável. Esse fenômeno obrigava a que para um espetáculo musical fosse quase obrigatório escolher repertório só de uma tonalidade: aquela para a qual a afinação estivesse prevista.

Pitágoras, experimentalmente, observou que dividindo-se a corda exatamente ao meio (para tanto se fixa o dispositivo móvel na metade do comprimento da corda) e tocando-se a mesma, escutava-se o intervalo da oitava em relação à nota original. Outros intervalos importantes, como a quinta justa e a quarta justa, eram obtidos também por frações de números pequenos (relações de 3/2 e 4/3 respectivamente). Os pitagóricos, então, desenvolveram um método de gerar novas notas a partir das conhecidas: dividindo ou multiplicando uma dessas relações por 3/2, e tomando sua metade, se o resultado for maior que dois, ou dobrá-lo, no caso dela ser menor que um. Com isso pode-se obter a escala diatônica, base de praticamente toda a música ocidental.

O tratado mais importante sobre a relação entre a Música e a Física foi escrito no século XIX, por Hermann Helmholtz. Tendo estudado ele também Medicina, seu livro Die Lehre von den Tonempfindungen não apenas trata da natureza física da consonância e dissonância dos sons, mas também da forma como o ouvido humano analisa essas particularidades.

O seguinte vídeo, do Ministério da Educação, resume este capítulo:

Conclusão:

A Música é um exercício de Aritmética secreta e aquele que a ela se consagra ignora que manipula números” - Leibniz (1646-1716).

Pesquisar este blog